Observação: Escrevi este artigo para a Revista Vitae em dezembro de 2021. Por qualquer motivo, em 2023, a revista já não se encontra mais online, então, para não perder o conteúdo e manter meu portfólio (salvo em PDF), postei aqui. Qualquer dúvida, por gentileza, entre em contacto. Boa leitura!
Ah, o Natal! Acredito que esta seja a época do ano mais especial, pois além das tradições de Natal, as cidades do mundo inteiro ficam iluminadas, coloridas e mais bonitas, tornando o clima mágico e trazendo alegria aos corações das pessoas.
Pensando nisso, decidi contar como essas tradições são celebradas em vários países. Acompanham-me nesta viagem para a Rússia? É totalmente free!!!
 |
Fonte: istockphoto |
Você sabia que o Natal Russo é celebrado no dia 7 de janeiro?
Por mais que Moscou decore as suas ruas com árvores e luzes natalinas logo no início de dezembro, a Igreja Ortodoxa Russa segue o calendário juliano e por isso o Natal russo é em janeiro.
Lembra-se de São Nicolau no artigo sobre o Pai Natal?
Então… a história da Rússia diz que no século XI, o príncipe Vladimir foi a Constantinopla para ser batizado e regressou com várias histórias de milagres realizados por São Nicolau. Desde então, ele tornou-se o santo padroeiro da Rússia.
Várias igrejas ortodoxas receberam o seu nome em homenagem ao santo e como a devoção a ele era muito intensa, Nicolau tornou-se um dos nomes mais populares para as crianças russas (até hoje!).
Interferência política nas tradições do Natal russo
De acordo com as minhas pesquisas, tudo começou há 3 séculos quando Pedro I – O Grande, após uma viagem pela Europa, voltou para a Rússia com uma árvore de Natal.
Com isso, muitas tradições das festas de fim de ano foram absorvidas, como por exemplo: decorar a árvore e a troca de presentes. Da mesma maneira que durante 2 séculos, assim como os outros europeus, também celebravam o nascimento de Jesus e o Ano Novo.
Entretanto, as tradições de Natal foram modificadas em 1917 quando os bolcheviques ocuparam o poder, censurando a decoração das árvores e as celebrações natalinas. Inexistiram a imagem de São Nicolau e a festa em sua homenagem em 6 de dezembro.
Mesmo com uma política comunista e ateísta, ainda havia a devoção enorme das pessoas à Igreja Ortodoxa e celebravam a data clandestinamente. Contudo, se algum membro político fosse descoberto praticando atos religiosos era banido do partido comunista.
Calendários, tradições e celebrações de Natal e de Ano Novo
 |
Fonte: Viajante Fora da Curva |
Dentro das mudanças que o Estado comunista realizou, está a alteração do calendário juliano para o gregoriano. Primeiro de tudo, deixem-me explicar a diferença entre eles:
Gregoriano é o calendário solar que conta os dias, semanas, meses e anos com base nas estações do ano. Foi criado em 1582, na Europa, pelo Papa Gregório XIII para substituir o calendário juliano – elaborado por Júlio César em 46 a.C.
Mas, Roberta, por que houve a substituição?
Porque antes de Júlio César, o calendário romano consistia em 355 dias e 12 meses, causando uma irregularidade entre o tempo natural e as estações do ano, já que estas ocorriam em datas diferentes.
Para ajustar esse descompasso, Júlio César alterou o calendário colocando um ano com 12 meses, 365 dias e 6 horas. Entretanto, as 6 horas que restavam de cada ano foram equilibradas em mais um dia em fevereiro, os anos bissextos, ou seja, a cada 4 anos.
Há uma diferença de 13 dias entre os calendários juliano e gregoriano, contudo quando se trata de assuntos religiosos, a maioria dos russos seguem o calendário juliano e é por isso que o seu Natal é celebrado a 7 de janeiro (dia do nascimento de Jesus). Quando se trata de outros assuntos que não tem nada a ver com religião, o calendário é o gregoriano.
Em 1937, a celebração do Ano Novo foi restituída pelo Estado por 2 motivos:
- A data não tinha vínculo com Natal e muito menos com religião e
- O país precisava de um feriado que pudesse “aquecer” o inverno gelado russo.
Então, qual foi a solução?
- Dos contos antigos, apareceu Ded Moroz (a versão eslava do Pai Natal) para substituir São Nicolau,
- Mantiveram a decoração das árvores de Ano Novo (não de Natal) e a troca de presentes na virada do ano (este tornou-se o feriado nacional mais importante da Rússia desde o final de 1940).
O bom velhinho russo
 |
Fonte: Redd.it/Free Pick/Blog Little Passports |
O Avô Frost ou Avô do Gelo ou Ded Moroz também presenteia as crianças e está sempre em companhia de sua neta Snegurochka, também conhecida como Donzela da Neve.
Diferente do Pai Natal, Ded Moroz não desce pela chaminé. Ele e a sua neta batem à porta das casas das famílias para entregar os presentes.
Características:
- Possui barba bem longa,
- Suas vestes podem ser das cores azul, branca ou vermelha, seu manto é bordado em dourado ou prateado e o comprimento vai até os tornozelos,
- Usa um cajado para ajudar sua locomoção a pé na neve e também uma carruagem puxada por 3 cavalos, ou seja, a Troika
- Sua neta usa vestes azuis, brancas, prateadas ou vermelhas,
- É jovem, bonita e intensos olhos azuis.
Tradições de Natal e Ano Novo
 |
Fonte: Rbth.com |
As datas oficiais de celebração nacional para os feriados de Ano Novo e Natal decorrem entre 31 de dezembro e 10 de janeiro.
Árvore de Ano Novo e Ded Moroz
Na véspera da passagem de ano, as crianças fazem um círculo ao redor da árvore de Ano Novo e enquanto aguardam a vinda do Avô Frost, realizam seus pedidos para Ded Moroz.
Quando ele e sua neta chegam, as luzes da árvore e da estrela no topo acendem-se. Nesse momento as crianças alegram-se e cumprimentam-se com a tradicional saudação russa de ano novo: Schástia/zdorôvia/uspêkhov v nôvom godú! – que significa “felicidade”, “saúde” ou “sucesso”.
Jejum na véspera de Natal
O jejum dos russos ortodoxos dura até ao momento em que aparece no céu a primeira estrela da noite (simbolizando a estrela que levou os reis magos até Jesus no dia de seu nascimento).
Mas calma, eles não passam fome, até porque como é inverno os dias são mais curtos. O jejum é quebrado com o Sochivo ou Kutia, um mingau de trigo ou de arroz servido com mel e frutas, sementes de papoila e nozes picadas.
Além do mingau, os russos comem o Borsch (sopa de beterraba), tortas de vegetais, salada de batata, Kulebyaka (torta de couve-coração/repolho), cebolas e cogumelos fritos e raízes de vegetais.
 |
Fonte: Dream Star/Glb.com/Food of Dream/Rbth.com |
Para ter uma ideia, uma refeição completa de véspera de Natal pode conter 12 receitas, representando os 12 apóstolos de Jesus.
No final da refeição, é servido o Vzvar, uma bebida doce preparada com frutas secas e mel fervidos em água (essa tradição da Vzvar ocorre também no nascimento de uma criança) e é consumida na véspera de Natal para celebrar o nascimento de Jesus.
O Kutia é igualzinho ao Sochivo, a diferença está na tradição. Ou seja, o Kutia é servido e comido por toda a família no mesmo recipiente, simbolizando a unidade familiar. Além disso, uma colher cheia de Kutia é jogada para o teto, assim, conforme a lenda, se colar no teto, a família terá boas colheitas e boa sorte no Ano Novo.
A Igreja Ortodoxa Russa não tem como prática comer qualquer proteína animal na véspera de Natal, por isso o menu apresenta essa variedade de receitas vegetarianas.
Após o desjejum, as orações são feitas e todos vão à igreja para a missa da meia-noite. No entanto, o tempo de permanência na igreja é tão longo que os russos não chegam a casa antes das 4 ou 5 horas da manhã.
A festa do Dia de Natal
A refeição do dia 7 de janeiro é uma verdadeira fartura. O banquete é mais rico, mais abundante que o da noite anterior, entretanto, inclui a proteína animal como ganso e porco assados, Pierogis e Pelmenis (bolinho de batata e de carne), tortas de frutas, pães de mel, frutas frescas, nozes e o Kozulya (biscoito açucarado em formato de ovelha, cabra e veado).
 |
Fonte: Woodland Patterns/Mom Dish/La Recette Polonais |
Decorações de mesa
Está cheia de simbologia religiosa. Por exemplo:
- A toalha branca simboliza as vestes do menino Jesus no dia de seu nascimento;
- O feno é colocado à mesa para lembrar que Jesus nasceu em circunstâncias humildes;
- A vela é alta e branca e colocada ao centro da mesa simbolizando Jesus como ‘a luz do mundo’.
- O pão é posto junto à vela para simbolizar Jesus como o ‘pão da vida’ no mundo.
Prevendo o futuro
É uma tradição super popular ler a sorte na véspera de Natal. Essa é uma prática conhecida como svyatki (que significa ‘santo’ e sua etimologia vem da palavra svyatoy, ‘sagrado’) e que decorre entre os dias 6 e 19 de janeiro.
Essa tradição vem do período mais pagão e profano do ano, pois para os russos o intervalo de tempo entre o nascimento e o batismo do menino Jesus era um ‘período sem a cruz’.
Ou seja, período em que ele aguardava um novo ciclo, um novo destino. É como se o destino para o próximo ano estivesse sendo definido. É uma tradição com raízes pagãs tão profundas que a própria igreja não conseguiu banir o svyatki.
Diz a lenda que neste período os espíritos ficavam livres, leves e soltos e auxiliavam nas previsões do futuro. Os camponeses queriam saber sobre o tempo e a colheita, já as jovens tentavam descobrir seu futuro no amor.
É muito comum fazer o ritual de adivinhação com vela, por exemplo:
- Derreter a cera e tentar adivinhar o destino através da imagem formada pela cera derretida;
- Acender a vela e, através das sombras na parede, prever o futuro (entre muitas outras práticas de rituais de adivinhação).
Ah! E para cumprimentar os amigos, sair pela cidade e festejar a noite de Ano Novo, só depois das 12 badaladas, afinal, é tradição!!
Gastronomia típica
 |
Fonte: Rbth.com |
E para finalizar o artigo, 4 receitas de entradinhas russas, rápidas e fáceis, para a sua ceia de Natal:
1 - Ovos recheados com cogumelos:- 10 ovos cozidos;
- 300 g de cogumelos;
- 1 cebola;
- 150 a 200 g de maionese;
- ervas, sal e pimenta a gosto.
Preparo: cozinhe os ovos, deixe esfriar e retire a casca delicadamente para manter a forma da clara. Pique os cogumelos e a cebola, frite com sal e pimenta e misture. Corte os ovos ao meio, delicadamente retire as gemas e amasse-as com um garfo. Em seguida, misture a gema com os cogumelos e cebolas e acrescente a maionese. Misture bem. Depois é só rechear o buraco das claras de ovo e salpicar por cima com as ervas.
2 - Tomates com queijo e alho:
- 4 tomates grandes;
- 200 g de queijo ralado (pode ralar na hora ou comprar ralado o de sua preferência);
- 2 dentes de alho;
- 150 g de maionese;
- ervas e sal a gosto.
Preparo: lave os tomates e corte em rodelas com 1 cm de espessura. Em seguida, rale o alho e misture com o queijo. Acrescente a maionese e o sal. Misture bem. Disponha a massa por cima das rodelas de tomate e salpique as ervas por cima.
3 - Rolinhos de berinjela com queijo e nozes:
- 2 berinjelas (as mais uniformes);
- sal;
- pimenta;
- salsa,
- 40 g de nozes;
- 1 dente de alho,
- 150 g de queijo cremoso (aquele para barrar no pão);
- palito para prender.
Preparo: Lave e corte as berinjelas em fatias finas com menos de 1 cm de espessura. Acrescente sal generosamente e deixe descansar durante 20 minutos. Retire o sal em água corrente (para reduzir o amargo). Seque as berinjelas, acrescente pimenta e frite (só para dar aquela selada, para isso, use um pingo de óleo. Se for preciso, use o papel toalha para absorver o excesso de gordura da berinjela). Reserve para arrefecer.
Recheio: pique a salsa, as nozes e o alho. Adicione o requeijão, sal e misture. Espalhe a massa de queijo por todo o comprimento da berinjela e enrole. Espete o palito para prender.
4 - Cestinhos com creme de ricota, salmão e ovas:
- 16 unidades de cestinhos prontos de massa quebrada;
- 140 g de creme de ricota;
- 50 g de salmão fatiado;
- 50 g de ovas;
- salsa para decorar.
Preparo: coloque o creme de ricota nos cestinhos. Faça rolinhos ou rosinhas com as fatias do salmão e coloque nos cestos. As ovas vão preencher o espaço restante e coloque a salsa por cima para enfeitar.
Então, eu fiquei com água na boca e você?
Espero-a no próximo embarque… Até já!
Fontes: Russia Beyond; The North Pole; Magnus Mundi; Ancestral Findings; Why Christmas